Por Marília DuarteSuperficialmente, Joe Goldberg parece ser o cara perfeito. Ele é inteligente, atencioso, administra uma livraria e, curiosamente, parece ter aquele jeitinho nerd sexy do Dan Humphrey de Gossip Girl (o personagem que deu fama ao ator Penn Badgley). No entanto, como as coisas nunca são tão simples quanto parecem, ele na verdade, é um completo stalker sociopata que se vê sortudo quando a jovem Beck entra na livraria e logo em seguida os dois criam uma conexão por causa da paixão pela literatura. Beck (que na verdade se chama Guinevere Beck – interpretada por Elizabeth Lail) é uma aspirante a escritora e possui uma vida on-line intensa, facilitando a coleta de tudo o que Joe precisa saber: o que ela faz, onde mora, a história da família e os amigos. Convencido de que ela é a mulher perfeita da sua vida, ele faz de tudo para provar que é digno de sua atenção. Ou seja, YOU traz uma história sobre um cara que não sabe a diferença entre obsessão e amor, vivendo em um mundo que muitas vezes tem o mesmo problema. Criada por Sara Gamble e Greg Berlanti e baseada no livro de mesmo nome escrito por Caroline Kepnes, a série é desenvolvida sob o ponto de vista de Joe (e em um episódio pelo de Beck) e traz diversas reviravoltas ao longo de seus 10 episódios, fazendo o expectador ficar viciado desde o início. A ambientação da série remete à Gossip Girl, ironicamente se passando em Nova York e trazendo Penn Badgley como protagonista. Mas seu Joe Goldberg não tem nada a ver com Dan Humphrey (apesar dele também ser um lonely boy na Big Apple). Não há mistério quanto aos motivos de Joe, porque sua narração está sempre presente, não apenas explicando suas ações, mas as racionalizando. Ele tenta fazer você entender que ele não está perseguindo Beck. Ele só precisa saber um pouco mais sobre ela para que ele não se machuque. E então, ele precisa ajudar a garantir que ela não se machuque pelas pessoas em sua vida (suas amigas e os bad boys que a descartam), ou por suas próprias escolhas e com isso, ele não tem medo de fazer o que for preciso para garantir uma “vida perfeita” para ela. Totalmente assustador né?! O roteiro não pretende ser sutil quando se trata de falar sobre a sociopatia de seu protagonista porque o fato é que, em muitos aspectos, Joe parece o tipo de cara que as garotas sonham em encontrar. E é isso que faz YOU construir uma dualidade em cima dos desdobramentos que algumas pessoas podem querer justificar de várias maneiras, com uma linguagem romântica sobre como Joe é o único que realmente vê Beck como ela realmente é, mesmo mostrando a dura realidade sobre o comportamento sociopata dele. Joe às vezes parece ser uma boa pessoa como é mostrado na sua relação com o vizinho Paco (Luca Padocan), tentando ajudar o garoto que vê diariamente sua mãe viciada ser abusada pelo namorado violento. Para Joe, Paco é como um espelho de sua infância também difícil. Ele se sente como um mentor do garoto, assim como o Sr. Mooney (o dono da livraria) foi para ele e sempre está incentivando- o a amar os livros profundamente. No entanto, Joe é aquele personagem com diversas camadas e sua história de fundo vai construindo o quebra-cabeça que é sua personalidade. E Penn Badgley está sensacional no papel (eu já gostava dele como ator desde Gossip Girl e da comédia Easy A), pontuando precisamente sua voz nas narrações e mesclando na tela os momentos do “cara perfeito” com o stalker obsessivo. Mas não é apenas Joe que se mostra um personagem complexo. Beck também possui camadas e uma história de fundo que é essencial para desenvolvê-la como uma personagem interessante. Ela teve problemas com seu pai no passado e o fato dela não ser privilegiada financeiramente como suas amigas são alguns dos aspectos que fazem com que ela esteja tentando se descobrir naquele mundo cheio de superficialidade e falando de forma clichê, tentando encontrar seu lugar ao sol como escritora. Sua relação com a melhor amiga Peach (Shay Mitchell) é outro fator essencial para o desenvolvimento da história, criando um triângulo Joe/Beck/Peach. Ter um namorado e uma amiga possessivos é uma situação muito complicada. E por isso, a série não romantiza em nenhum momento os relacionamentos abusivos que são moldados na história. Há sim algumas conveniências de roteiro, como toda série possui, mas isso não afeta a qualidade da trama, que tenta fugir de características maniqueístas e trabalha muito bem os tons de cinza dos personagens. Além disso, a crítica sobre o mundo baseados em curtidas de redes sociais também trazem um algo a mais para a história. A presença de várias mulheres no roteiro e direção dos episódios são outros aspectos essenciais para o sucesso da série e para o desenvolvimento do plot principal e seus subplots, que não poupa em mostrar a obsessão masculina por autoafirmação e por querer ser o objetivo da vida de uma mulher, comportamento bastante comum na nossa sociedade machista, afinal, não precisa ser um stalker sociopata para querer controlar a vida de sua parceira. O mundo tá cheio de homens que praticam os mais diversos comportamentos abusivos considerados “normais” pelo patriarcado. Um “simples comentário” negativo sobre o tipo de roupa que sua parceira usa ou sobre ela usar "maquiagem demais" são sinais de relacionamento abusivo. O perigo às vezes pode ser algo excitante, mas essa frase que quase soa como um ditado é aplicada perfeitamente a YOU. Quanto mais sentimos o perigo rondar dentro da trama, mais viciados ficamos pela série. E ao mesmo tempo em que nos sentimos viciados pela história de Joe Goldberg, refletimos sobre o quão é comum se deparar com caras possessivos e fica a questão: Who Are You? |
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March 2022
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