Por Marília DuarteNova York é cenário para diversos filmes e séries de época que muitas vezes procuram não glamourizar a cidade e mostrar histórias com significados mais realistas e profundos (e às vezes cruéis). Exemplos não faltam como o filme Gangues de Nova York de Martin Scorsese e a série The Knick de Steven Soderbergh. The Alienist, série produzida pela TNT norte-americana e distribuída pela Netflix, é uma ótima adição a essas histórias ambientadas em Nova York. Ela retrata minuciosamente a cidade em 1896 como se estivesse pintando uma tapeçaria única - uma cidade que é tão confortável hospedando a violência de Scorsese e a intensidade de Spike Lee como também os adornos de uma sociedade hipócrita. A cidade com seus cortiços e avenidas desempenha um papel importante na série baseada no livro de Caleb Carr, um thriller psicológico sobre um serial killer e o grupo de investigadores em seu rastro. Depois do brutal assassinato de um menino que trabalhava como prostituto em um bordel da cidade, o recém-nomeado comissário de polícia Theodore Roosevelt (Brian Geraghty) apela aos serviços do Dr. Laszlo Kreizler, um psicólogo criminal, para investigar o crime. O Dr. Kreizler, interpretado por Daniel Brühl, conta com o suporte de outras pessoas talentosas: o seu melhor amigo - o cartunista do New York Times John Moore (interpretado por Luke Evans); dois jovens irmãos detetives, Marcus e Lucius Isaacson (vividos por Douglas Smith e Matthew Shear); e a secretária do comissário, Sara Howard (interpretada por Dakota Fanning). A dinâmica entre esse grupo de personagens tão diferentes um do outro e impulsionados por motivações distintas é muito bem escrita. Cada um deles possui sua história de fundo que aos poucos se tornam relevantes para desenvolvê-los como personagens e para dar andamento à narrativa. Entre os roteiristas estão Hossein Amini (do filme Drive), Gina Gionfriddo (de House of Cards) e Cary Joji Fukunaga, que foi responsável pela excelente 1ª temporada de True Detective e recentemente pela minissérie Maniac. Embora Fukunaga não tenha dirigido nenhum dos 10 episódios de The Alienist, a direção da série possui o requinte semelhante ao trabalho dele e os créditos são do excelente trabalho dos diretores, entre eles Jakob Verbruggen, um dos produtores da série. Além disso, ela conta com o ótimo trabalho de design de produção e direção de arte uma vez que os episódios foram filmados em Budapeste, onde construíram ruas inteiras, vestidas imaculadamente para recriar a Nova York de 1896. A série realmente o transporta para outra época e com isso seguimos os protagonistas enquanto perseguem pistas em becos escuros, investigam bordéis cheios de doenças e assistem a óperas enquanto tentam impedir um assassino de matar mais outros garotos pobres da cidade. E juntamente com essas investigações, a narrativa também discute a corrupção existente na polícia nova-iorquina e nas famílias influentes da cidade. O Dr. Kreizler é um personagem muito interessante, obcecado pelo seu alto desempenho, não diferente do Sherlock de Benedict Cumberbatch na série britânica baseada na obra de Arthur Conan Doyle. O passado conturbado do Dr. Kreizler e sua precisão clínica adicionam uma camada de mistério que permanece obscura até o fim. Outro ponto interessante do personagem é o relacionamento dele com seus três empregados, Mary, Cyrus e Stevie (vividos por Q'orianka Kilcher, Robert Wisdom e Matt Lintz), em que ambos são protegidos pelo Doutor e chega um momento em que ele se questiona sobre esse sistema de servidão em sua casa. Daniel Brühl é impecável como sempre e seu trabalho na série é merecedora de indicações aos prêmios da tv. No entanto, do trio central, Dakota Fanning é o verdadeiro destaque. Sara é uma personagem maravilhosa e super empoderada uma vez que para os costumes da época, ser uma jovem solteira de uma família respeitável trabalhando num ambiente predominantemente masculino (o departamento de polícia da cidade) era algo quase impensável para a sociedade. Perseguir assassinos, entrar em bordéis decadentes e questionar a autoridade masculina era algo impróprio para uma mulher. Há determinadas cenas em que ela questiona e comenta a visão estúpida da época (mas que infelizmente ainda existe) sobre o papel da mulher na sociedade como numa cena onde ela encontra seus ex-colegas de faculdade e uma das colegas defende a ideia de que é preciso casar para ser feliz. Outra cena bem no início da série enquanto Sara se veste, ela questiona a necessidade de se usar cintas apertadas e fala algo como “Parecem que eles têm medo de nossas curvas” se referindo aos costumes impostos pelo patriarcado (costumes que ainda são impostos, de outras maneiras, pela nossa atual sociedade machista ). A interpretação de Dakota está maravilhosa e fico muito feliz por ela voltar a mostrar que é uma atriz talentosa depois de alguns filmes que não deram muito certo. Fechando o trio protagonista, temos John Moore, que representa quase que a voz da razão para o Dr. Kreizler. E, além disso, ele é um personagem a quem a gente se apega de verdade pelo sentimento de humanidade que existe dentro dele. Luke Evans (reizinho do meu coração) também está ótimo em seu papel. Todos os subplots destes personagens contribuem para o drama, e funciona como uma distração temporária (e pausa) do horror dos crimes que estão investigando. E falando na investigação, ela é desenvolvida através de pistas e plot twists instigantes fazendo o suspense crescer a cada episódio. No centro destas investigações há discussões interessantes sobre o preconceito a imigrantes, o preconceito de gênero e traumas extremos. The Alienist é baseada em apenas um dos livros de Caleb Carr e, portanto, com o sucesso dessa temporada uma segunda foi confirmada em que adaptará outro livro com esses personagens, o The Angel of Darkness. Isso significa que muito em breve veremos Laszlo, Sara e John em ação novamente. |
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March 2022
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